07/11/2006

Lavratura de termos circunstanciados pela Polícia Militar do RJ, inércia institucional, interesses públicos, privados e o nefasto poder político.

Muita gente não sabe, mas a PMERJ já lavrou, em dois momentos distintos, termos circunstanciados, sendo a segunda Corporação, após a Brigada Militar (RS), a deflagrar, já em 1997, via Comandante do Batalhão de Polícia Rodoviária, tal processo (hoje, há diversos estados da federação em que tal modalidade de atuação já se aplica).
Mas de que processo/modalidade de atuação estamos falando?
O termo circunstanciado é um instrumento que substitui os inquéritos policiais e autos de prisão em flagrante delito nas hipóteses de infrações penais de menor potencial ofensivo (contravenções penais e crimes comuns cujas penas máximas não sejam maiores do que dois anos - ressalvados casos em que lei posterior define de forma diversa - violência doméstica, por exemplo). Em tais hipóteses, de acordo com a Lei n.º 9099/95, a autoridade policial (qualquer uma - delegado, investigador, policial militar, comissário, etc - desde que o agente público esteja no exercício de poder de polícia, conforme sucessivas posições jurisprudenciais e doutrinárias) deve lavrar termo circunstanciado e encaminhar o autor, o mais rápido possível, ao Juizado Especial Criminal (na prática, em virtude da ausência de tais juizados funcionando 24 horas, como deveria ser, o infrator assina um termo de compromisso de comparecimento, com data e hora marcadas e a documentação é encaminhada ao juizado).
Em análise bastante apertada, a lei dos Juizados Especiais Criminais buscou a redução da IMPUNIDADE, diante da maior celeridade imposta à prestação jurisdicional, ou seja, à resposta do estado ante às infrações penais, trocando ainda a solução eminentemente penal (cárcere) por solução cível, onde a satisfação da vítima passa a ser mais importante do que a mera reprimenda estatal.
Discorrendo sobre a experiência propriamente dita, cabe pontuar que quase uma década atrás, diante do espírito da lei, movido por problemas causados pela Delegacia de Polícia de Campos dos Goytacazes para o simples registro de direção sem habilitação, munido do arcabouço doutrinário de Damásio Evangelista de Jesus e sob os auspícios do juiz de direito local, Ronaldo Assed, o então TC Hamilton Leandro Saldanha, verdadeiro vanguardista, DETERMINOU a LAVRATURA de TERMOS CIRCUNSTANCIADOS pelos militares do Batalhão de Polícia Rodoviária (BPRv), naquele momento, apenas em Campos dos Goytacazes, oficiando ao Comando da PM para INFORMAR acerca de sua decisão (que, em verdade, apenas cumpria o disposto na Lei n.º 9099/95, plenamente amparada pelo Judiciário local).
Pois bem, a experiência foi um total sucesso, funcionando a pleno vapor, até que o TC SALDANHA foi substituído no Comando do BPRv e então, ante à inércia institucional e talvez incompreensão interna e externa acerca do bem estar público proporcionado, ela simplesmente PAROU (talvez devêssemos buscar saber de seu substituto o motivo pelo qual não levou à frente tão nobre mister).
Em 2005, o P/3 (Chefe do Setor de Planejamento) do TC SALDANHA no BPRv, TC Ronaldo Antonio de Menezes, assume o Cmdo do Btl de São Gonçalo e, diante do quadro absurdo de homicídios (NÃO ELUCIDADOS, É CLARO - INVESTIGAÇÃO ZERO), da coincidência geográfica dos mesmos com infrações de menor potencial ofensivo, do número absurdo de ocorrências atendidas pela PMERJ e ENCERRADAS no LOCAL (que, examinadas, denotaram serem, em verdade e em sua grande maioria, infrações de menor potencial ofensivo) e do tempo absurdo tomado pela Polícia Civil para a lavratura de meros termos circunstanciados, buscava soluções e, adivinhem, surgiu, mais uma vez, a figura da LAVRATURA de TERMOS CIRCUNSTANCIADOS.
Em 22 de agosto de 2005, sem solenidade, entrega de "mimos", diplomas de "amigo do Btl", fotos, imprensa, etc, mas com a vênia (e o incentivo) do judiciário local, na pessoa do nobre e arrojado juiz Marcelo Anátocles e equipe (da qual destacamos os funcionários e amigos Oliveira e Humberto), com o conhecimento do Cmt Geral da Corporação e do Pres. do Tribunal de Justiça e contra todas as expectativas (exceto as nossas e as do judiciário), os militares das rádio-patrulhas e destacamentos do 7º BPM retomaram a lavratura de termos circunstanciados pela PMERJ.
Agora, com o know-how acumulado desde 1997, foi possível montar estrutura ainda mais eficaz e atuar de forma "absurdamente" ampla (para padrões da pré-história).
Após a deflagração de processo de preparação psicológica (sensibilização) e instrução, que durou cerca de três meses, do advento de Nota de Instrução alusiva à questão (NI n.º 001/2005) da impressão dos blocos de termos circunstanciados, da obtenção de mão-de-obra qualificada e VOLUNTÁRIA junto à própria tropa e do investimento de aproximados R$4.500,00 (procurem saber o valor de uma delegacia legal), nosso MÓDULO ESPECIAL CRIMINAL começou a funcionar.
Como as coisas aconteciam de fato?
No Módulo, em escala de serviço 12x48h (já adaptada à carga horária prevista - e ignorada - no estado - vejam matéria no blog: www.wanderbymedeiros.blogspot.com) começaram atuando nossos Bacharéis/estudantes de Direito (2º Sgt Heraldo de Amorim GUSMÃO e MILTON Oliveira de Sousa, 3º Sgt José Augusto MOURA Sobrinho e EFIGÊNIA Alves de Souza Roza e Cb MARCELO Renato da Silva Monteiro), chefiados pelo 2º Ten Rodrigo José LOUREIRO da Silva.
Quando o militar assumia a ocorrência de menor potencial, antes encerrada no local ou demandante de duas ou três horas fora do patrulhamento, no balcão da delegacia, ele chamava, via rádio, o Módulo, que, ciente dos fatos e da agenda do judiciário, fornecia o número do termo a ser lavrado, a data/hora da audiência e mesmo a requisição, em havendo necessidade de exames de corpo de delito. O militar encerrava a ocorrência NO LOCAL DOS FATOS, sem afastar-se do patrulhamento, todavia, o fazia com a audiência preliminar já marcada, fornecendo a vítima (sendo o caso) a competente requisição de exame de corpo de delito.
Mas fazíamos um pouco mais. Quando a ocorrência envolvia violência doméstica (à época, em geral, infração de menor potencial), a vítima também recebia encaminhamento para atendimento gracioso em centro especializado em violência doméstica; e mais, no dia seguinte ao primeiro atendimento, fazíamos contato com a vítima para buscarmos aferir a qualidade de nossos serviços, além de "monitorarmos" sua situação, dispensando-lhe ainda maior atenção (inspirados por aquela história do médico que, diferentemente de seus colegas, ligava para o paciente entre uma e outra consulta para saber se havia tomado o remédio e se o efeito esperado havia sido alcançado).
O que foi escrito ACONTECEU DE VERDADE, ao longo de quase trinta dias, em que lavramos exatos QUARENTA e QUATRO TERMOS CIRCUNSTANCIADOS, TODOS RESULTANDO EM PROCESSOS JUDICIAIS, encaminhando dezenas de vítimas de violência a atendimento gratuito, apreendendo inúmeros materiais (facas, foices, etc), emitindo requisições de exames de corpo de delito (TODAS ATENDIDAS pela escrava da VERDADE, e não dos delegados, Polícia Técnica - Tribobó), marcando audiências delivery e, acreditamos, REDUZINDO A IMPUNIDADE.
Acreditávamos que a LAVRATURA de TERMOS CIRCUNSTANCIADOS poderia atuar como importante vetor, não apenas para a MELHORIA DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS PELA PM, mas pela própria POLÍCIA CIVIL, que poderia destinar seus esforços para INVESTIGAÇÃO, elevando, quem sabe, as pífias (e quase secretas, afinal, somente foram divulgadas uma única vez, em meados de 2003), taxas de ELUCIDAÇÃO DE DELITOS.
É fato ainda que conseguimos, sem aumento de efetivo, intensificar a presença da PM nos logradouros públicos, já que liberamos nossos militares da penosa rotina de passar horas em delegacias para a lavratura de meros termos circunstanciados.
É verdade também que nossos termos circunstanciados, digitados por nossa pequena equipe, eram encaminhados ao judiciário em apenas CINCO DIAS (delegacias, segundo soubemos, levavam MESES para fazê-lo).
A auto estima de nossa tropa foi recrudescida, pois nossas rádio-patrulhas deixavam de ser "táxis" ofertados por uma polícia de segunda categoria para realmente ofertar soluções técnicas e céleres às querelas com as quais se deparavam, na condução de verdadeiros MEDIADORES DE CONFLITOS.
A CREDIBILIDADE também mereceu influência positiva, já que aquele mesmo PM de antes, agora RESOLVIA CONFLITOS e se portava de forma TÉCNICA (em nosso controle de qualidade, ousamos avaliar até as expressões utilizadas pelos militares)
Nosso MÓDULO ESPECIAL CRIMINAL, mais que preocupar-se apenas com a simples lavratura de termos circunstanciados, atuava como CONSULTORIA TÉCNICA à tropa (nossos operadores tinham amplo acesso à rede mundial de computadores, além de razoável biblioteca disponível), fornecendo aos nossos militares MAIOR SEGURANÇA E RESPALDO NA ATUAÇÃO.
A luta foi grande, pois delegados de polícia, temerosos da perda de status quo (artificial, é verdade), tentaram de várias maneiras BARRAR o processo. Além de petições impetradas junto à administração (curiosamente, nada foi tentado junto ao judiciário) por sua associação contra o TC MENEZES, nós chegamos ao disparate de termos que impetrar um HC tendo como pacientes integrantes de uma guarnição de RP, coagidos em razão de Registro de Ocorrência, noticiado por delegado, em que apontava PREVARICAÇÃO em face da lavratura pelos mesmos de TERMO CIRCUNSTANCIADO (tamanho era o desespero e a pressa, que os eruditos delegados sequer perceberam que, em se configurando a conduta, a apuração seria de competência da Polícia Judiciária Castrense, pois o crime seria militar).
É bom ressaltar que TODAS as lutas foram travadas sem apoio institucional, com táticas delineadas por nós mesmos nos gabinetes e corredores do 7º BPM e tendo ao nosso lado poucos colaboradores, que perceberam o bem estar público propiciado e tentaram, dentro de seus limites, apoiar a causa.
Em 19 de setembro de 2005 o Sr Cel HUDSON DE AGUIAR MIRANDA, atendendo à solicitação do Delegado Itagiba (então secretário de SEGURANÇA PÚBLICA e hoje, Dep federal eleito), DETERMINOU que CESSÁSSEMOS a LAVRATURA de TERMOS CIRCUNSTANCIADOS, o que foi feito.
Mas o trabalho está longe de haver sido em vão! Hoje, temos ainda uma ação em curso sobre a matéria, movida pela ÚNICA ASSOCIAÇÃO que realmente abraçou a causa (ASSINAP), além de um projeto de Lei do ÚNICO Dep Estadual que hipotecou apoio ostensivo à causa, FLÁVIO BOLSONARO, visando corrigir a distorção que se verifica com a RESERVA DE MERCADO propiciada POLITICAMENTE à Polícia Civil no que toca à lavratura de termos circunstanciados, ao contrário do texto da lei, de esmagadora doutrina e mesmo de jurisprudência favorável (sem falar, é claro, do aspecto principal, ou seja, O INTERESSE PÚBLICO).
Note-se que o mesmo Delegado Itagiba que suscitou a interrupção do processo, negou exclusividade aos delegados de polícia para a lavratura de termos circunstanciados (ao contrário do que pregam) ao permitir, via Res. SESP n.º 843, de 28 de março de 2006, que tal mister competisse aos comissários de polícia.
Resta sabermos POR QUE REAL MOTIVO PARAMOS? QUAIS FORAM OS REAIS INTERESSES QUE PRESIDIRAM A DECISÃO? FORAM INTERESSES PÚBLICOS?
É bom lembrar que hoje há Coronéis que compreendem a importância para a população da LAVRATURA de TERMOS CIRCUNSTANCIADOS pela PMERJ, e, ao menos ao que parece, COMPRARAM A IDÉIA. Queira o Grande Arquiteto do Universo que a um deles recaia o exercício do cargo de Comandante Geral e, mais ainda, que permaneça fiel às suas convicções, ainda que tenha que lutar contra NEFASTOS INTERESSES, MARCHANDO COM O PÉ DIREITO NO BUMBO.

7 comentários:

  1. Anônimo23:34

    Lendo nesse texto o trabalho desenvolvido pelo Módulo Especial Criminal tive a impressão de um serviço realizado em países de primeiro mundo. Como pode um trabalho tão valoroso não receber apoio das autoridades? O interesse público não irá nunca sobrepor interesses excusos? Por isso o estardalhaço do blog "Projeto 200 anos". Na verdade não estamos nós, SOCIEDADE, acostumados com a idéia de construirmos num país melhor...

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  2. Obrigado pelos comentário Fernandes.
    Ajude a divulgar a idéia.

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  3. Anônimo15:59

    Termo circunstanciado feito pela pela milicia estadual? Não é preciso nem dizer o quão ridícula seria a idéia. Se os milicianos não sabem nem o que é crime, levando a DP como se fosse crime todos os dias, todas as horas fatos atípicos, que dirá determinar se uma infração penal é de menor potencial ofensivo ou não.
    O direito penal castrense, pelo menos no âmbito dos Estados é algo que tende a acabar. Uma justiça criada só para julgar PM e Bombeiro, que a sociedade hoje pugna para que termine. (assim como a própria militarizaçao das coorporações PM e Bombeiro). Daí, dizer que um armígero, que nem curso superior tem (não adianta que a escola de formação de oficiais da PM não é reconhecida como curso superior. Se duvida, tente se inscrever em concurso para Auditor Fiscal ou Agente de Polícia Federal com esse diploma) exerce funçao jurídica porque, pode, uma vez na vida, uma vez na morte, vir a participar de um conselho de justificação é brincadeira. Tão brincadeira quanto o Juiz Arbitral ou quanto os antigos Juizes Classistas da Justiça do Trabalho.

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  4. Anônimo, muito obrigado pelos comentários.
    Eles parecem refletir a indignação, quase jocosa, de alguém não muito "antenado" com as mudanças processuais havidas no Brasil, talvez preso às amarras inquisitorias e preconceitos institucionais.
    De qualquer maneira, creio que se preste à indignação dos integrantes da milícia fluminense, os quais não apenas exercem a polícia judiciária (via APF e IPM), como também (algo impensável no âmbito de qualquer Polícia, que não a militar), funções jurisdicionais (além, naturalmente, de amplo arcabouço de funções de natureza eminentemente administrativa, via exercício do poder de polícia de preservação da ordem pública).
    Quanto ao CFO, seu reconhecimento como curso superior é oriundo do poder executivo federal, se dando em regime de internato, com carga-horária diária de oito horas, ao longo de três anos, e abarcando amplo conteúdo programático, com ênfase em Direito, Psicologia, Chefia e Liderança, Segurança Pública, etc).
    Sugiro, por fim, procure saber como as coisas andam, por exemplo, no Rio Grande do Sul (dentre outras UF) onde, em benefício da democratização do acesso à justiça e da redução da sensação de impunidade, a milícia estadual lavra termos circunstanciados desde 1996.

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  5. Anônimo17:52

    Percebe-se que esse anonimo ficou recalcado com os resultados obtidos no 7º BPM perante a sociedade. Acho então que ele deveria explicar o fato de não se encontrar delegados durante a madrugada nas delegacias. O fato da autoridade de policia judiciaria nunca comparecer aos locais de crime, principalmente quando estes são nas favelas e debaixo de intenso combate. E principalmente de delegados que não conseguem visualizar um flagrante presumido, previsto legalmente...

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  6. Anônimo17:55

    E bom seria se fosse uma vez na vida e outra na morte a participação de oficiais em conselhos...bem como, apf, ipm e demais procedimentos apuratórios

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  7. Anônimo15:04

    Este comentário malicioso só nos da forças para ir mais além, continue assim Maj Wanderby o Sr. tem todo o apoio dos componentes do 7º BPM.

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