25/05/2010

Som alto é questão de polícia!

Sei que no RJ, onde as noções de certo e errado se afiguram cada vez mais nebulosas, isso pode parecer um absurdo, mas à luz da legislação vigente no Brasil, quem utiliza equipamento sonoro acarretando prejuízo ao sossego de outros comete contravenção penal, que deve ser apreciada em sede de Juizado Especial Criminal.
Mas e quanto às causas? Seriam culturais?
Duvido de tal simplória explicação!
Que tal mergulharmos um pouco na realidade?
Em uma abordagem muito otimista (reconheço), o que acontece quando o problema existe?
Ligação para 190 - espera - chegada da viatura da PM - espera - redução do volume - ausência da viatura da PM - espera - elevação do volume - ligação para 190...
Claro que há outra alternativa, talvez ainda mais otimista:
Ligação para 190 - espera - chegada da viatura da PM - espera - redução do volume - ausência da viatura da PM - espera - elevação do volume - ligação para 190 - espera - chegada da viatura da PM - espera - condução de autor e vítimas para uma Delegacia de Polícia - espera - tomada de depoimentos - espera - lavratura de termo circunstanciado - espera - aposição de alguns despachos - espera - encaminhamento ao poder judiciário...
Acredito que a realidade da práxis apregoada pelos gestores da segurança pública no RJ ofereça a melhor justificação para a realidade vivenciada por autores e vítimas da prática desrespeitosa (poderíamos falar de muitas outras) em questão.
Mas qual seria a explicação para que, apesar de tudo, nada tenha ainda mudado?
Qual seria a justificativa para que as autoridades da SESEG/RJ façam questão de empregar delegados de polícia (nem sempre presentes ao ato) para a lavratura de meros termos circunstanciados, contribuindo para que tenham potenciais argumentos para a não realização a contento do importante trabalho de elucidação de delitos gravosos (homicídios dolosos, estupros, latrocínios, roubos, furtos, etc.) que lhes cabe e que tanto medo e desespero acarretam à população fluminense?
O que levaria o Instituto de Segurança Pública a ocultar as taxas de elucidação de delitos gravosos e a sequer monitorar as infrações penais de menor potencial?
E qual seria também a justificativa para que policiais militares permaneçam atuando como meros taxistas de ocorrências às já abarrotadas Delegacias de Polícia, impondo à população serviço oneroso e de péssima qualidade, quando as alternativas para sua otimização são notórias, econômicas e relativamente simples?
Por que tamanha vontade de manter Delegacias de Polícia como cartórios e Policiais Militares como seus "garçons"?
Por que tamanho desprezo para com a população?
Cenário vigente no RS, terra natal do secretário de segurança do RJ:
Ligação para 190 - espera - chegada da viatura da PM - redução do volume - lavratura de termo circunstanciado e marcação de audiência preliminar (em juízo), não sendo descartada a possibilidade de apreensão do material fonte da perturbação...
Simples assim!
A sensação de impunidade é combustível da prática reiterada do desreipeito à legislação e não dá para acreditar em "política de segurança pública" que não adote medidas concretas (e não falo, é claro, de marketing) para reduzi-la.
Não pode? É... inconstitucional?
Não me parece ser a posição do atual Presidente do Supremo Tribunal Federal:

20/05/2010

Homicídio doloso?

Imprecisão talvez não tão grande quanto a afirmação de que a liberação do policial militar decorreu de "apresentação espontânea".
Sim, estou escrevendo sobre o homicídio do cidadão que portava uma furadeira pelo militar do BOPE.
Qual é o motivo de que deriva a aparente preocupação de dirigentes da Polícia Civil do RJ em investigar fatos sem competência legal para tal, ofertando declarações à imprensa, que, por vezes, parece menos ávida por respostas do que apta a formular questões?
Vale destacar que mesmo em se tratando de homicídio doloso, no caso, os autos do inquérito policial (militar) é que devem ser alvo de remessa à Justiça Comum (Lei n.º 9299/96).
Não se trata aqui de defender uma ou outra instituição, mas sim e inicialmente de defender que ações e competências sejam exercidas sob o império dos referenciais legais vigentes no Brasil. Afinal, a quem e/ou a que propósitos interessa não fazê-lo?
O militar do BOPE pode ser responsabilizado? É claro! A previsão de legítima defesa putativa é expressa no Código Penal (art. 20, § 1º) e não afasta a possibilidade de aplicação de pena, todavia, por homicídio culposo (resultando verídicas as alegações iniciais).
"Art. 20 - O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei.
§ 1º - É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Não há isenção de pena quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime culposo.".
Por outro lado, haveria maior imperícia nos militares que apertam os gatilhos ou nos gestores que manejam os cordames que produzem regularmente novas vítimas inocentes?
Será que os legisladores tinham em mente a noção de accountability quando do advento do § 2º do dispositivo supra:
"§ 2º - Responde pelo crime o terceiro que determina o erro.".
Acho que não! Ou não?

Não importa... No RJ não importa!
Um soldado e também vítima da "guerra contra as drogas" matou mais um inocente.
Um delegado, mesmo sem competência legal, já investigou e apurou o caso, rotulando-o como homicídio doloso (quem "apresentou a ocorrência na DP" mesmo?).
Duas famílias estão certamente sofrendo.
A Secretaria de Segurança já prometeu "apoio" à família do trabalhador morto.
Já temos o fato, o autor, a vítima e algumas promessas de alento...
Os que manejam os cordames continuam incólumes e até festejados por alguns...
Vamos em frente! O importante é manter a "guerra contra as drogas"... Às favas com todo o resto...