Afinal, o passado não é apenas silêncio, senão também presença
Os primórdios
Desde então, a rua antes conhecida por Caminho dos Arcos Velhos da Carioca, e Caminho do Desterro, começa a ser chamada Rua dos Barbonos. E, finalmente, Evaristo da Veiga.
Surge o Quartel dos Barbonos
Desde o primeiro dia de sua existência real o Quartel dos Barbonos sempre foi o quartel-central da PM.
Viram, dia e noite, a saída das patrulhas para as ruazinhas estreitas, mergulhadas na tristonha penumbra dos lampiões de azeite.
Em 1735, padres da terra Santa – esmoleres dos Santos Lugares, ou Santo Sepulcro – erguem um pequeno eremitério em terrenos de uma chácara no Caminho da Ajuda, para N. S. do Desterro.
Com o andar do tempo, a minúscula instituição passa a denominar-se Hospício de Jerusalém de N. S. de Oliveira.
Mais tarde – em 1742 – ali se alojam os missionários barbadinhos ou barbônios (italianos).
Desde então, a rua antes conhecida por Caminho dos Arcos Velhos da Carioca, e Caminho do Desterro, começa a ser chamada Rua dos Barbonos. E, finalmente, Evaristo da Veiga.
Em 1771 o desembargador João Alberto Castelo Branco manda buscar no Norte duas mudas de café, plantadas depois na horta do Hospício dos Barbonos.
Tratados carinhosamente pelos frades barbadinhos, esses dois pés de café tornaram-se a mãe dadivosa dos cafezais da Província do Rio de Janeiro, e, em parte, da de São Paulo.
Na terra carioca, pois, - no chão do pátio do quartel general da PM – é que se plantaram as primeiras mudas de café, vindas do Norte.
O ano de 1808 assinala a retirada dos barbadinhos italianos do Hospício dos Barbonos. E as celas vazias, ocupam-nas os frades carmelitas.
Criado o CORPO DE GUARDAS MUNICIPAIS PERMANENTES – decreto da Regência de 22-outubro-1831 – instala-se ele no convento dos frades carmelitas, antigo Hospício de Jerusalém, também denominado quartel dos granadeiros, visto haver, por algum tempo, agasalhado uma Cia deles.
Tal aquartelamento implica a saída dos carmelitas. E o convento, onde se alojaram os MUNICIPAIS PERMANENTES, toma a designação de Quartel dos Barbonos.
A capela de Nossa Senhora das Dores. A subscrição de sete contos de réis (7:000$000), iniciativa do Cel. Assunção
Posto à testa do comando do CORPO MILITAR DE POLÍCIA DA CORTE em 1870, o Cel. Joaquim Antônio Fernandes de Assunção, num abaixo-assinado entre oficiais e praças, levanta a quantia de 7:000$000, objetivando erguer uma capela consagrada a Nossa Senhora das Dores.
Com a presença do Imperador D. Pedro II, no comando do Cel. Andrade Pinto – pois Assunção já não estava entre os vivos – inaugura-se a ermida a 29-maio-1881.
A importância do Quartel dos Barbonos ao longo dos anos
Desde o primeiro dia de sua existência real o Quartel dos Barbonos sempre foi o quartel-central da PM.
Em verdade, esse quartel é o único pedaço vivo da Corporação, vindo dum passado distante. Do fundo do século findo. Os outros das Cias, isoladas – na quadra dos primeiro e segundo reinado – desapareceram da face da Cidade. De pé, resistindo aos vendavais do tempo, só ele, o antigo convento dos carmelitas. O mundo triste das penitencias e orações.
Naquele chão outrora virgem e exuberante, moveram-se os pés descalços dos pobres frades do Hospício dos Barbonos, no cultivo da horta e dos pés de café.
E as grossas paredes que as mãos do progresso derrubaram, e a igrejinha centenária ainda de pé, viram cenas e figuras humanas de um pretérito longínquo.
Viram, dia e noite, a saída das patrulhas para as ruazinhas estreitas, mergulhadas na tristonha penumbra dos lampiões de azeite.
Viram, muitas vezes, a cavalo – à frente da tropa – o jovem major Luís Alves de Lima e Silva, mais tarde Duque de Caxias, a quem o grande Império entregaria os destinos da Pátria.
Viram a partida do 31º de Voluntários para os campos de batalha do Paraguai, e à testa da tropa o bravo coronel Machado da Costa, tombado epicamente em combate.
Viram a efígie da amizade e da gratidão no corpo de um humilde animal – o cão Bruto – seguindo os seus amigos, oficiais e praças.
Viram o retorno dos heróis, trazendo ainda, bem vivas, diante dos olhos, as imagens e visões angustiantes das sangrentas batalhas. E o triunfo para o tecido das crônicas gloriosas. E a volta de Bruto, o companheiro certo na paz e na guerra. E a bandeira em farrapos, retrato vivo de recontros furiosos.
Viram aquele comandante que certamente chorava quando tinha de punir alguém: o Cel. Pedro Drago.
Viram Assunção, já magro e doente, subindo para a sua casa no Morro Santo Antônio.
Viram a figura respeitável de D. Pedro II, na sua derradeira visita, talvez já de semblante melancólico, ouvindo nos corredores do tempo as primeiras passadas da República.
Viram a partida do CORPO MILITAR DE POLÍCIA rumando para o Campo de Santana, fortalecendo as forças imperiais, em defesa da Monarquia, à beira de seu atestado de óbito.
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Sim, velho pátio do Quartel dos Barbonos, o passado da Corporação mora ali. Formaturas, gritos de comando, toques de corneta acordando o Velho Caminho do Desterro, o Campo da Lapa, os Arcos da Carioca. Toques de corneta dentro da noite, angustiando o coração de pobres recrutas de terras distantes.
Afinal, o passado não é apenas silêncio, senão também presença. Como silêncio, ele dorme nas palavras escritas da História da PM. Como presença, ele agarra-se ao vulto triste do Quartel dos Barbonos, que agora lá está, a face escura de servidor cansado erguida no ar.
Em seu derredor, rugem as vozes agressivas da era atômica. E as forças da evolução ameaçam a cada instante transformá-lo em pó.
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Fonte: FABRI, Ferrúcio. Ergue-se e fala o passado da PMERJ: Irmandade de Nossa Senhora das Dores da PMERJ. vol. 1.